Parúsia

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Brasil, século XXI. Um cometa não esperado surge nos céus do Brasil. A população especula se não seria a segunda vinda de Jesus, anunciada por essa “estrela” (a “Parúsia” do título). Um casal, ela grávida, é expulso de suas terras; um golpe de estado sacode o país, um bispo em crise espiritual aguarda a morte, vidas simples se entrelaçam num quadro de crise extrema.

Do Capítulo 1 da Segunda Parte:

ii)

Na cidade morava Mara, a moça mais bonita, a mais cobiçada, a mais cortejada. Era o sonho do filho do meio do fazendeiro e do único do meeiro. Lucas e Paulo, amigos de infância, repartiram brinquedos (primeiro de Lucas, depois de Paulo), roupas (primeiro de Lucas, depois de Paulo), comida (primeiro Lucas, depois Paulo), mas evidentemente agora era diferente. Diga-se a seu favor que para ela o dinheiro ou a falta dele não fazia pender a balança para nenhum lado, mas um carro é sempre melhor que um burro. E o primeiro beijo foi na boca de Lucas, a primeira jura no ouvido de Lucas, a primeira cama a de Lucas. Disso tudo Paulo soube, e calou. Manteve seus esforços na labuta, tentando um jeito de continuar a estudar. Enquanto os filhos do fazendeiro eram doutores, ele acabara de terminar o segundo grau, aos trancos e barrancos. Ajudar o pai de sol a sol era o melhor jeito de esquecer a morena viçosa, os olhos pretos, a perna roliça… Se se permitisse, choraria ao lembrar dos olhos de Mara. Não permitindo, seus olhos o desobedeciam. Agora ele a sabia fora de alcance, paciência. Sabia que algum dia a esqueceria. Num futuro distante, com certeza.

iii)

-Não, Mara, não posso ficar mais. Tenho que ir p’ra casa, tem um pessoal do Rio me esperando.

-Mais um pouquinho só…

-Não dá, meu bem, amanhã a gente se vê.

Saiu da casa velha que a família há gerações usava para a mesma coisa, onde seus irmãos bastardos provavelmente foram produzidos, e correu para a sede da fazenda. Moço viajado, rapidamente se entediara dos limitados horizontes de Mara, e prato mais suculento e substancioso o esperava em casa: a filha do candidato a comprar as terras.

Num acordo tácito, Mara saiu 15 minutos depois, e sem ter o que fazer, resoveu sair sonhando pela estrada.

iv)

O “pessoal do Rio” era loura, bonita, falava francês e muito imaginativa. Sexo na mata era coisa que ela nunca havia experimentado, então seu anfitrião não podia fazer uma desfeita destas. A porteira tinha umas travessas bem a feitio para este mister, e a essa hora ninguém apareceria, com certeza. A não ser uma caipira apaixonada, que, à falta do que fazer, resolvera andar estrada a dentro, para ver se via o amado por uma janela, ou por uma porta aberta.

v)

Paulo a encontrou no fosso, arranhada, quase afogada. Passara a noite na água barrenta, não se sabia bem como ela fora parar lá, estava mal, com febre. Levou-a para casa, mandou avisar a mãe da moça, e cumpriu seu papel de bom caráter. O tempo, claro, cumpriu também o seu, e em pouco tempo trocavam o primeiro beijo. Primeiro Lucas, depois Paulo, como convinha.